21.12.06

You are welcome to elsinore

Entre nós e as palavras há metal fundente
wntre nós e as palavras há hélices que andam
e podem dar-nos morte violar-nos tirar
do mais fundo de nós o mais útil segredo
entre nós e as palavras há perfis ardentes
espaços cheios de gente de costas
altas flores venenosas portas por abrir
e escadas e ponteiros e crianças sentadas
à espera do seu tempo e do seu precipício

Ao longo da muralha que habitamos
há palavras de vida há palavras de morte
há palavras imensas,que esperam por nós
e outras,frágeis,que deixaram de esperar
há palavras acesas como barcos
e há palavras homens,palavras que guardam
o seu segredo e a sua posição

Entre nós e as palavras,surdamente,
as mãos e as paredes de elsinore

E há palavras nocturnas palavras gemidos
palavras que nos sobem ilegíveis à boca
palavras diamantes palavras nunca escritas
palavras impossíveis de escrever
por não termos connosco cordas de violinos
nem todo o sangue do mundo nem todo o amplexo do ar
e os braços dos amantes escrevem muito alto
muito além do azul onde oxidados morrem
palavras maternais só sombra só soluço
só espasmo só amor só solidão desfeita

Entre nós e as palavras,os emparedados
e entre nós e as palavras, o nosso dever falar

Mári Cesariny " Quinze poetas portugueses do séc. XX "

24.11.06

Se me amas não chores

Se conhecesses o mistério imenso do céu
onde agora vivo,este horizonte sem fim,
esta luz que tudo reveste e penetra,
não chorarias,se me amas!
Estou já absorvido no encanto de Deus,
na sua infindável beleza.
Permanece em mim o teu amor,uma
enorme ternura que nem tu consegues
imaginar.
Vivo num alegria puríssima.
Nas angústias do tempo pensa nesta casa
onde um dia estaremos reunidos para al´me
da morte,matando a sede na fonte
inesgotável da alegria e do amor infinito.
Não chores,se verdadeiramente me amas!

Santo Agostinho


Verdadeiramente bela esta oração...transmite-me muita paz e sossego

Depois da guerra

Depois da guerra vão nascer lírios nas pedras,
grandes lírios cor de sangue,belas rosas
desmaiadas.Depois da guerra vai haver fertelidade,
vai haver natalidade,vai haver felecidade(...)
Depois da guerra não haverá mais tristeza:todo o
mundo se abraçando num geral desarmamento(...)
No meio tempo,vamos dando tempo ao tempo,
tomando nosso chopinho,trabalhando p`ra família.
Se cada um ficar quieto no seu canto,fazendo as
coisas certinho,sem aturar desaforo,se cada um
tomar vergonha na cara,for p`ra guerra,for p`ra fila
com vontade e paciência-não é possível!esse
negócio melhora,porque ou eu muito me engano,
ou tudo isso não passa de um grande,de um
doloroso,e um atroz mal entendido!

Vinicius de Moraes " O poeta não tem fim"

15.10.06

Falar alto e sozinho.Ir pela rua,sozinho,falando com ninguém e com todos.Fazer parte do munod e estar só no mundo e chamar,em vão,pelo mundo.
Dizer-lhe as palavras precisas.Certas,esclarecedoras.
Únicas.Assim o homem que rompe a direito,concentrado e decisivo.~
-Não e não!
Não o quê?Não porquê? Será que os outros não sabem?
-ah!-reprova-se aquele velho.se eu voltasse atrás!...-e logo se encoraja-É sempre tempo para se fazer o que se deve!
Que foi que ele não fez?
-Fomos nós?-inquieta-se um outro que o ouviu-Fomos nós e ele que ainda o não fizemos?
Há também quem sorria dos que passam falando sozinhos.Maneira de escapar-se,de fugir aos problemas.
Sorrir e esquecer o que se ouve na rua é estar dormindo.
Não por muito tempo.um breve sono apenas.Os pesadelos do dia-a-dia crescem,sobem,afogam.
-Hão-de acabar por ouvir!-exclama aquele homem à beira do passeio.
Até os que vão calados falam.Pela forma de andar,pelos gestos,ouvem-se-lhes as palavras.E lá vão,entaipados,solitários na multidão.

António da Fonseca " Tempo de solidão"

Que diremos ainda?

Vê como de súbito o céu se fecha
sobre dunas e barcos,
e cada um de nós se volta e fixa
os olhos umno outro,
e como deles devagar escorre
a última luz sobre as areias.

Que diremos ainda?Serão palavras,
isto que aflora aos lábios?
Palavras,este rumor tão leve
que ouvimos o dia a desprender-se?
Palavras,ou luz ainda?

Palavras,não.Quem as sabia?
Foi apenas lembrança de outra luz.
Nem luz seria,apenas outro olhar.

Eugénio de Andrade " Quinze poetas portugueses do séc XX"

1.10.06

Caos temporal

Num dos caminhos da noite
em que a noite era branca como o dia
encontrei o caminho para fora
da noite.

De dia,no caminho que me fizera
sair da noite
como se fosse dia encontrei um dia escuro
como a noite.

Entre a noite e o dia
todos os caminhos são
iguais.Só os caminhos que tornam o dia
negro como a noite e a noite
branca como o dia
fazem com que o viajante
se perca.

A não ser que quem ande de dia
como de noite,e de noite
como de dia,não queira saber de
caminhos.

Nuno Júdice "Teoria geral do sentimento"

25.9.06

Viagens

já vai alta a noite,vejo o negro do céu,
deitado na areia,o teu corpo e o meu.
viajo com as mãos por entre as montanhas e os
rios,
e sinto nos meus lábios os teus doces e frios.

e voas sobre o mar,com as asas que eu te dou,
e dizes-me a cantar: " é assim que eu sou",
olhar para ti e ver o que eu vejo,
olhar-te nos olhos com olhares de desejo,
eu não tenho nada mais p´ra te dar,
esta vida são dois dias,
e um é para acordar,
das histórias de encantar
das histórias de encantar.

viagens que se perdem no tempo,
viagens sem princípio nem fim,
beijos entregues ao vento,
e amor em mares de cetim.
gestos que riscam o ar
e olhares que trazem solidão,
pedras e praias e o céu a bailar,
e os corpos que fogem do chão.

Pedro Abrunhosa e os Bandemónio " Viagens"

29.8.06

Depois de algum tempo aprendes a diferença, a subtil
diferença,
entre dar a mão e acorrentar uma alma.E aprendes que
amar não
significa apoiar-se,e que companhia nem sempre
significa segurança.E começas a aprender que beijos não são contratos, e presentes não são promessas.
(...) e não importa o quão boa seja uma pessoa,ela
vai ferir-te de vez em quando e precisas perdoá-la por
isso.Aprendes que falar pode aliviar dores
emocionais.Descobres que se leva anos para se
construir confiança e apenas segundos para
destruí-la,e que podes fazer coisas num instante,das
quais te arrependerás pelo resto da vida.Aprendes que
verdadeiras amizades continuam a crescer mesmo a
longas distâncias.E o que importa não é o que tu
tens na vida,mas quem tens na vida.(...)Descobres
que as pessoas com quem mais te importas na vida,são
tiradas de ti muito depressa;por isso,sempre devemos
deixar as pessoas que amamos com palavras amorosas;
pode ser a última vez que as vemos.(...)Aprendes
que paciência requer muita prática.(...)Aprendes que
quando estás com riava tens o direito de estar com
raiva,mas isso não dá o direito de seres cruel.
Aprendes que nem sempre é suficiente ser perdoado por
alguém.Algumas vezes,tens que aprender a
perdoar-te a ti mesmo.Aprendes que com a mesma
severidade com que julgas,tu serás em algum momento,
condenado.Aprendes que nao importa em quantos pedaços
teu coração foi partido,o mundo não pára para que o
consertes.E,finalmante,aprendes que o tempo,não é
algo que possa voltar para trás.Portanto,planta teu
jardim e decora tua alma,ao invés de esperar que
alguém te traga flores.E percebes que realmante és forte,e que podes
ir muito mais longe depois de pensar que não se pode
mais.E que realmente a vida tem valor,e que tu tens
valor diante da vida!(...)E só nos faz perder o
bem que poderíamos conquistar,o medo de tentar!

Shakespeare

20.7.06

Estoicismo

Tu que não crês,nem amas,nem esperas,
Espírito de eterna negação,
Teu hálito gelou-me o coração
E destroçou-me da alma as primaveras...

Atravessando regiões austeras,
Cheias de noite e cava escuridão,
Como num sonho mau,só ouço um não,
Que eternamente ecoa entre as esferas...

-Porque suspiras,porque te lamentas.
Cobarde coração?Debalde intentas
Opôr à sorte a queixa de egoísmo...

Deixa aos tímidos,deixa aos sonhadores
A esperança vã,seus vãos fulgores....
Sabe tu encarar sereno o abismo!

Antero de Quental " Sonetos"
a tua ausência é,em cada momento,a tua ausência
não esqueço que os teus lábios existem longe de mim.
aqui há casas vazias.há cidades desertas.há lugares.

mas eu lembro que o tempo é outra coisa,e tenho
tanta pena de perder um instante dos teus cabelos.

aqui não há palavras.há a tua ausência.há o medo sem os
teus lábios,sem os teus cabelos.fecho os olhos para te ver
e para não chorar.

José luís peixoto " A casa, a escuridão"


dedicado a um anjo que tenho a certeza que nunca mais vou ver na minha vida.
obrigada por tudo....e por me ajudares imenso neste capítulo que passou recentemente..
nunca esquecerei esses lindos olhos negros..
nunca te esquecerei..bj

9.7.06

Cheguei hoje, de repente a uma sensação absurda e justa.
Reparei, num relâmpago íntimo, que nã o sou ninguém.Ninguém,
absolutamnte ninguém.Quando brilhou o relâmpago,
aquilo onde supus uma cidade era um plaino deserto; e a luz
sinistra que me mostrou a mim não revelou céu acima dele.
Roubaram-me o poder ser antes que o mundo o fosse. Se tive
que reincarnar,reincarnei sem mim, sem eu ter reincarnado.

Sou os arredores de uma vila que não há,o comentário prolixo a um livro
que não se escreveu. Não sou ninguém,ninguém.Não sei sentir, nem pensar, não sei querer.
Sou uma figura de romance por escrever,passando aérea, e desfeita sem
ter sido, entre os sonhos de quem me não soube completar.

Penso sempre, sinto sempre; mas o meu pensamento não contém raciocínios, a minha emoção não contém emoções.Estou caindo, depois do alçapão lá em cima, por todo o espaço infinito, numa queda sem direcção,infinítupla e vazia.Minha alma é um maelstrom negro, vasta vertigem à roda de vácuo, movimento de um oceano infinito em torno de um buraco em nada,
e nas águas que são mais giro que águas bóiam todas as imagens do que vi e ouvi no mundo-
vão casas, caras, livros, caixotes, rastros de música e sílabas de vozes, num rodopio
sinistro e sem fundo.

E eu, verdadeiramnet eu, sou o centro que não há nisto
senão por uma geometria do abismo; sou o nada em torno do
qual este movimento gira,só para que gire, só para que gire, sem que esse centro
exista senão porque todo o círculo o tem.Eu, verdadeiramente eu, sou o poço sem muros, mas com a viscosidade dos muros, o centro de tudo com o nada à roda.

E é, em mim, como se o inferno ele mesmo risse, sem ao menos a humanidade de diabos a rirem, a loucura grasnada do universo morto, o cadáver rodante do espaço físico, o fim de todos os mundos flutuando negro ao vento, disforme, anacrónico, sem Deus que o houvesse criado, se, ele mesmo que está rodando nas trevas das trevas, impossível, único, tudo.

Poder saber pensar!Poder saber sentir!

Minha mãe morreu muito cedo, e eu não a cheguei a conhecer...

Bernardo Soares " Livro Do Desassossego"

18.6.06

Pois é........

este blog costuma ser um pouco impessoal porque normamente nao opino sobreo o que escrevo....mas hoje tenho uma notícia para dar que acho que devo partilhar com todos os que perdem um pouco do seu tempo para me visitar..
Ora bem..nem sei como começar.....
Sou bombeira nos bombeiros voluntários da póvoa de lanhoso.sempre quis fazer isto...mas só agora foi possível concretizar este sonho antigo.....
não sei porque estou a dizer isto..mas talvez por orgulho =) e um pouco de vaidade LOL.....
mas pronto..assim ficam a conhecer um pouco mais sobre o meu mundo tão ainda desconhecido para muitos de vós..
Bj*
MAKE LOVE...FUCK THE WAR
Aqui me tens inútil
cheia de palavras
perto de ti tão longe
mastigando todas as pétalas
dos teus crisântemos
afiando solos de violino
para me suicidar.

Descubro de novo as lágrimas
esquecidas no fundo das grutas
o trémulo grito do silêncio.

Anoiteço à procura dos dias
que as gaivotas beberam.

E a tua voz sem corpo
súbita e descuidada
enche-me as ancas de bagos de romã.

Rosa Lobato Faria " As pequenas palavras"

11.6.06

Out tonight

Today,i want to feel alive
I`ll try not to run
I`ll try not to hide.
Sometimes,i find myself looking
For something to belive,
Something to dream,can I ?
I want to go out tonight
I need to free my mind,
I want to be me,just me
Need to be free,just free
Tonight
Oh,time changed so many faces and places
I would like to go out and see what´s breaking
You left your name and number on a wall
At least you laughed the last time you called
I want to go out tonight,
I need to free my mind,
Want to be me,just me
Need to be free,just free
I want to say yea,yea,yeaeee
Tonight


ezspecial " in n `out"

1.6.06

todo o amor do mundo não foi suficiente porque o amor não serve
de nada.ficaram só
os papéis e a tristeza,ficou só a amargura e a cinza dos cigarros
e da morte.
os domingos e as noites que passámos a fazer planos não foram
suficientes e foram
demasiadas porque hoje são como sangue no teu rosto,são como
lágrimas.
sei que nos amamos muito e um dia,quando já não te encontro e em
cada instante,em cada hora,
não irei negar isso.não irei negar nunca que te amei.nem mesmo
quando estiver deitado
nu,sobre os lençois de outra e ela me obrigar a dizer que
a amo
antes de a foder.

José Luís Peixoto " A criança em ruínas"

Os olhos das crianças

Estes olhos vazios e brilhantes
que na criança se abrem para o mundo,
não amam,
não odeiam,
não sabem como a morte existe.
São terríveis.
Porque a vida é isto.

O amor, o medo, o ódio, a mesma morte,
e este desejo de possuir alguém,
os aprendemos.Nunca mais olhamos
com tal vazio dentro das pupilas.

São terríveis
Porque a vida é isto.

Jorge de Sena

Dedicatória a todas as crianças
por esse universo que estão sós...hoje é o seu dia

28.5.06

O jovem mágico

....
.... Basta ver os meus olhos nada sabemos de nós
a não ser que chegamos.
Sem uma luz a esconder-nos o rosto
belos e apavorados de estranhos casacos vestidos
altos de meter medo às aves de longo curso
nem há noites assim não há encontros
ao longo das enseadas
não há corpos amantes não há lugares de astros
sob tanto silêncio tão duradoura treva
e não me fales nunca eu sou surdo e não te oiço
eu vou nascer numa cidade futura
eu sei atravessar as fronteiras das coisas
olha para as minhas mãos que te pareço agora?
....

Mário Cesariny de Vasconcelos " Poesia"

11.5.06

A morte não é nada.Eu só passei para o quarto ao lado.
Eu sou eu,tu és tu,o que nós éramos uma para a outra,
nós o seremo sempre.
Chama-me como tu sempre me chamaste.
Fala comigo como sempre o fizeste
Não uses um tom diferente,não fiques com ar solene ou triste.
Continua a rir daquilo que nos fazia rir juntas.
Reza,ri-te,pensa em mim,reza por mim.
Que o meu nome seja pronunciado em casa como ele sempre foi,
sem um traço,sem uma sombra.
A vida significa tudo o que sempre significou.
Ela é o que sempre foi.O fio não está cortado!
Porque estarei eu fora de vista ?
Eu espero-te.Eu não estou longe.
Apenas dou outro lado do caminho,no quarto ao lado.
Como vês tudo está bem.

Desconhecido(encontrei este poema num dos meus apontamentos de uma cadeira da universidade-bioética..e achei fabulosa esta discrição da morte..essa que tantas vezes nos faz chorar)

28.4.06

Right now(i might fall down)

Tonight i feel that you`re alone
Waitinga sad inside inside your homeless soul
Where´s so cold
some words are to be said not to understand
Now you show me your regret and pain
but baby its all the same
Right now
You know you don´t want this game
I´m not saying you´re the one to blame
Please try to understand
Love me for real
And beg me for nothing,nothing at all
Don´t ask me to feel your shoes with my dancing
Sometimes i might fall down
When the winds are changing
And they´re changing
Right now
Baby i don´t want this game
I´m not saying you´re the one to blame
Your groove is not the same
I don´t know
What you´re looking for
I give you all i got
But you want more
Something i don´t feel
Love me for real
And beg me for notnhing,nothing at all
Don´t ask me to feel your shoes with my dancing
Sometimes i might fall down
When the winds are changing
And they´re changing
Right now

Blister "Without truth you are the loser"

20.4.06

"A nossa vida é composta em grande parte por sonhos. temos de encaminhá-los para a acção!" Faz com que os teus sonhos comecem a fazer parte da tua realidade acreditando neles com a maior força e nunca deixes de lutar por aquilo que tu acreditas!!! Fada*

Beijinho grande pa ra ti Sarinha..gosto muito de ti

19.4.06

Só para dizer que alterei o nome dos meus outros dois blogs
(caso ainda não saibam eu tenho mais dois blogs..
se a curiosidade vos incomodar podem ir a view my complete profile e tenho lá os outros).
Espero lá comentários ok ?
Já há algum tempo que George deixou de trazer-lhe
flores ou outros presentes.Actualmente,não há nada de
significativo que possa trazer do exterior para este quart;
nem mesmo ele próprio.Tudo o que lhe interessa agora
está aqui neste quarto,onde está absorvida no processo da
morte.Contudo, a sua preocupação não parece ego´sita;
não exclui George ou qualquer outra pessoa que se dê ao
trabalho de compartilhá-la.Esta preocupação é com a
morte, etodos nós podemos partilhá-la,em quaçquer altura,
em qualquer idade,doentes ou sãos.
George senta-se agora a seu lado e pega-lhe na mão.
Se o tivesse feito à dois dois meses atrás,ter-se-ia tratado de
um gesto terrivelmente falso./(Uma das suas recordações
mais amargas e vergonhosas tem a ver com uma vez em
que a beijou na face-foi uma agressão,um acto de
masochismo?Oh,raios partam todas estas palavras!-
exactamente depois de descobrir que ela fora para a cama
com Jim.Jim estava presente quando isso aconteceu.
Quando George se encaminhou para ela para a beijar,
Jim fez um ara espantado e assustado,como se receasse que
George fosse mordê-la como uma cobra.)Mas agora não
está a ser falso ao pegar na mão de Doris,nem mesmo
a cometer um acto de compaixão.É necessário-desco-
brui-o em visitas anteriores-a fim de estabelecer um
contacto mesmo que parcial.E ,ao pegar-lhe na mão,sen-
te-se embaraçado coma sua doença,pois esse gestes signi-
fica estamos no mesmo barco,em breve seguir-te-ei.Deste
modo estará desculpado pelo facto de ter de fazer aquelas
perguntas horríveis que se fazem aos doentes.Como está?
Como estão a correr as coisas?Como se sente?
Doris esboça um sorriso débil.Será poque lhe agrada
Que ele tenha vindo?

ISHERWOOD " Um Homem no singular"

9.4.06

Noite

Deixo atrás- o quê ? que sombras
vagas me perseguem ainda, como insectos que nenhuma treva
assusta ?Fujo! E as asas calcárias do louva-a-deus
colam-se-me às costas.Voo,agora,levando comigo
o fogo terrestre.Nenhum orizonte de ontem me poupará
o remorso de uma eternidade crepuscular: céus cinzentos
que entrevejo da esplanada branca do casino;o barco imóvel,
na enseada,apontando o nascente. E desço a escada
de pedra,com um lento rasto de caracol nocturno,
levando comigo a fúnebre notícia: " Ali,
onde um astro pousara o seu casco,deixando a luminosa
impressão de um fundo musical, os meus olhos beberam o último
brilho";e uma constelação de sais prendeu a sonâmbula
inspiração do vento.

Nuno Júdice "Obra Poética"

31.3.06

Antes que seja tarde

Amigo,
tu que choras uma angústia qualquer
e falas de coisas mansas como o luar
e paradas
como as águas de um lago adormecido,
acorda!
Deixa de vez
as margens do regato solitário
onde te miras
como se fosses a tua namorada.
Abandona o jardim sem flores
desse país inventado
onde tu és o único habitante.
Deixa os desejos sem rumo
de barco ao deus-dará
e esse ar de renúncia
às coisas do mundo.
Acorda,amigo,
liberta-te dessa paz podre de milagre
que existe
apenas na tua imaginação.
Abre os olhos e olha
abre os braços e luta!
Amigo,
antes da morte vir
nasce de vez para a vida.

Manuel da Fonseca " Poemas completos"

23.3.06

Pergunto-me quanta gente nesta cidade

Pergunto-me quanta gente nesta cidade
vive em apartamentos mobilados.
Altas horas da noite quando olho os outros prédios
juro que vejo um rosto em cada janela
que me olha também
e quando volto para dentro
pergunto-me quantos se sentam às suas escrivaninhas
e escrevem isto


Leonard Cohen " Filhos da neve"

12.3.06

Descrição de um lugar

Sou um reflexo no vidro.Olho-me
fixamente, e o poema capta-me nesta atitude.
Pudesse eu conhecer-me como se conhece
o poema...
Deixo um retrato de mim,morto,
há um ano por esta altura.Que me aconteceu,
entretanto?De quem é este corpo
que me é estranho pálido habitante de um movimento
indeciso e aparente?Quem sinto quando me toco,
quem me dorme,quem me pensa,
quem me escreve? O meu rosto enconbre um pronome.vivo
uma sintaxe corrupta no patamar marítimo
do mito.Quem me impede o sentimento?Quem me abre
um caminho que não sigo,condeno o outro
de mim próprio?
No entanto,estou aqui.Entre mim e o poema,
opaco a ambos,sem nada para dizer.

Nuno Júdice "Obra poética"

3.3.06

Olho-te e a morte ronda perto.Jogo com o tempo com essa presença que me assusta e atrai.Há em ti qualquer coisa de irremediável,de profundo desespero.

" O meu amanhã é a sombra.Corpo corrompido..Tenho medo da minha morte...."-disseste
Ouve:
Era uma vez um Homem que se queria renovado.
Era uma vez um Homem que se aturdia com mu«inutos tão cheios que não tinham ecos de relógio.E o ar juvenil,a adoração da mulher a dizê-lo vivo e belo e capaz...O Homem bebeu o mais que pode da seiva jovem,para provar a distância da morte.Por momentos,o homem cansado foi efebo e fauno,o homem doente foi gazela veloz,cavalo alado,grito de esperança.
Enternecedor esse sorriso de homem frágil,à procura do renascer.
Homem fugindo da evidência.

Maria graciette Bessse " Mulher sentada no silêncio"
Amei-te com as palavras
com o verde ramo das palavras
e a pomba assustada do coração.

Amei-te com os olhos
o espelho doido dos olhos
e a sede inextinguível da boca.

Amei-te com a pele
as pernas e os pés
e todos os gritos que trago
por debaixo da roupa.
Amei-te com as mãos
as mesmas com que te digo adeus.

Rosa Lobato Faria " As pequenas Palavras"
O silêncio não existe porque é o constante rumor de uma
inexistência.O que se ouve, para além do movimento da cidade,
é o monótono murmúrio do nada.Apenas sombra de nada,quem
nele procura um apelo ou uma resposta não os encontra ou
encontra um sinal negativo.Nada diz esse murmúrio nulo,que é
o eco inalterável do vazio do mundo,mas quem o ouve sente a
radicalidade da sua negação como se a cada momento nos
dissesse: Não há.

António Ramos Rosa "Relâmpago de nada"

12.2.06

Tristezas

Hoje estou triste, já ontem estava
O meu ser é a tristeza, não só a minha
O meu ser é a erva mais daninha
A que mata e parece ter beleza

Hoje estou triste com a minha pobreza
Pobreza moral,material e natural
A pobreza do rico que se julga imortal
A pobreza do senhor,do chefe,do rei

Mas quem sou eu para estar assim tão triste ?
Não sei quem sou nem nunca o saberei

Oiço o barulho dos carros que lá vão
A caminho do fim,a caminho da morte
Que levam cruzes nos vidros para dar sorte
Cruzes de papel coladas nas vidraças

.....

Manuel Luís Caeiro " Flores do Alentejo"

É assim que eu me sinto todos os dias

Ouve estas palavras

ouve estas palavras escritas.ouve os trovões em países distantes.
enquanto lês estas palavras,eu estou debaixo desses trovões.
estas palavras foram escritas numa cidade que já não existe.

para mim é tão importante que entendas,mas o sangue no chão
é tão difícil de explicar.todas as pessoas que se vestiram de luto
à minha volta disseram-me que estava louco, mas tu sorriste.

lembras-te ?lembras-te de mim ?com as mãos sobre o peito,
juro-te que ainda sou o mesmo, a única diferença é este medo
de que tenha deixado de entender e de que já não consigas sorrir.

José Luís Peixoto " A casa, A escuridão"

Para ti que estás aí e nunca mes esqueceste......

4.2.06

Escrever para trocar uma maor pela memória dele.
Escrever para renovar incessantemente
a falsa eternidade.Abrindo um caminho para o sangue.Abrindo
um espaço onde instalar o corpo que apodrece, sílaba a sílaba.

Mata-se o amor por dentro das palavras que escrevem contornando os ângulos da página paisagem.
Mata-se o amor, para ficar dele a memória mais assassina, o grito mais claro de funda solidão.

....

A arte do amor que se escreve reinventando-se é uma ficção dolorosamente apreendida.
As palavras-repetidas, de obcessão-as palavras,dizia tornam mais irremediável este súbito silêncio,dia vertical sem a sombra do teu sangue.tua linfa.
Meu sopro veloz. De trágica morte.

Maria graciette besse " Mulher sentada no silêncio"

Não estás cansada?

Não estás cansada
da tua beleza esta noite ?
Como podes carregar esse peso
debaixo das estrelas ?
O teu cabelo
ou os teus lábios
eram suficientes para te esmagar
Consegues ver-me quando passo
a correr
o pesado New York Times debaixo do braço
com a tua fotografia
algures
no seu interior ?

Leonard Cohen " Filhos da neve"

28.1.06

Lisboa, 2 de Junho de 1994

Querida Marta,

Tenho dado tudo por tudo para me aguentar, mas é tão difícil! O doutor Gonçalves( o meu novo psicólogo) diz que vou conseguir, mas não sei se é apenas para me encorajar.Deve ser uma táctica dos psicólogos para fazer de conta que toda a gente é capaz de tudo.
Seja como for,preciso de acreditar nele, já que em mim não acredito.Insiste em que tenho de desabafar,partilhar. O quê? com quem ?
Esta tarde,quando estava a baloiçar-me na minha lua,olhei para o pulso esquerdo e tive vontade de arrancar a pele para a tatuagem sair.Agora é tarde demais.O meu relógio continua parado nas zero horas de um dia que ainda não chegou.Quem poderá dar-lhe corda ?
Estou contente por não ter vendido a tua colecção de caléidoscópios, mas a verdade é que também não sei se seria fácil arranjar comprador, não sei se estes tubinhos mágicos têm aquilo a que se chama valor comercial.
Contigo sou sempre sincera, mas só contigo.
A minha mãe tem feito um esforço para falar comigo, mas não tem jeito, não é por mal.Falta de hábito...quando não sabe que assunto puxar, pôem-se a falar das clientes da loja, as Xaxões, as Pituchas, as Ninis, as Dadinhas, as Coitadinhas... O meu pai anda triste, mas não diz nada.No outro dia, quando olhou para mim percebi que se comoveu(talvez por eu estar muito magra) mas segue à risca o velho ditado " um homem não chora" e disfarça, põe um sorriso de plástico e faz de conta que está a correr tudo bem. Tenho pena do meu pai, tenho mesmo muita pena.Deve ser frustrante ter uma filha como eu, pior ainda do que ser pai do Pré-histórico, embora me custe um bocado a admiti-lo.
O meu quarto está atafulhado de coisas inúteis e não gosto da nova janela que colocaram para substituir a que eu parti o mês passado, num dia em que quis " voar" daqui para fora( mais um dia para esquecer...).
Que será feito do diogo?Também não sei nada do Luís, da Sara, das gémeas...Só o João pedro é que telefona de vez em quando,sempre animador" Daqui a uns dias já estás na maior,miúda, vais ver. É só uma questão de tempo". Tempo, o eterno enigma que eu gostav de desvendar...Disse-me também que quer vir ver-me, mas prefiro que ele não me veja assim.
Não saberia como explicar-lhe, e ele haveria de achar-me a pessoa mais estúpida, mais incoerente e mais absurda do planeta. Basta ouvi-lo ao telefone para perceber que não me perdoa. Não posso criticá-lo por isso.
Eu também não me perdoo. Em contrapartida,já consegui perdoar-te Marta.Finalmente!Ainda não compreendi as tuas razões(e talvez nunca venha a compreênde-las),mas devem ter sido fortes.Apesar de continuar a pensar que a tua família é melhor do que a minha,talvez tu tivesses descoberto algo de muito errado,alguma coisa que não conseguiste partilhar(a palavra que o meu psicólogo mais usa) com ninguém, nem comigo.Deve ter sido alguma verdade demasiado demasiado terível.Quanto a mim,já sei o que descobri.Descobri que a lógica só existe em matemática e que tudo é tão absurdo que só estamos em paz a dormir(quando não se tem sonhos como eu tenho) e descobri ainda que o meu melhor amigo é um cão( sempre é melhor do que não ter amigos, não é?).
Ás vezes lembro-me de como eu tinha a mania de ser perfeita e isso dá-me vontade de rir.As ideias ridículas que me vinhas à cabeça! Tanta coisa que eu não sabia à um ano atrás!Que ignorante que eu era!
Quando fizemos,lá na escola,aquela peça de teatro inspirada em ti,Os Amigos da Onça,o ano passdo,nunca imaginei que fosse tão fácil uma pessoa passar-se para lá,para o lado onde tu passate,o lado que eu sabia que estava ERRADO! quis tanto compreender tudo aquilo que te tinha acontecido,aquilo por que tinhas passado quando te afastaste de toda a genta que acabei por seguir um caminho muito parecido,talvez mesmo igual.Fui muito injusta por te ter condenado,criticado e até odiado,Marta.Acho que aprendi.Espero que não seja tarde.
Um beijo da
Joana

Maria Teresa Maia gonzalez " A Lua De Joana" ( o livro que conta em parte a minha história)
faz um ano que comecei nesta onda dos blogs.....
um muito obrigada a todos os que por cá passam e me tem dado muita força para seguir em frente neste caminho duro......
sinceramente nao pensei que ia aguentar muito tempo..mas acabou por se tornar o meu diário público..onde muito de mim cá está......onde as vezes uma lágrima cai quando escrevo..um sorriso esboço quando estou contente.....(apesar de ser uma pessoa triste)...
peço desculpa se alguam vez magoei alguém mas não foi por mal....é dificil aguentar...
mas continuarei a escrever porque descobri que isto alivia a minha dor e me ajuda melhor a passar a solidão

MAKE LOVE...FUCK THE WAR

8.1.06

W.B yeals em rapalho

A janela fechada não exala barulho.Uma luz estranha
atravessa o ar.Ouço-me, de súbito, contra o fundo de
ruídos diversos.Os objectos saem do quotidiano torpor,
e uma voz surge enquanto a luz, matinal,parece lembrar
que nada é como antes foi.
E se resolvo sair da cadeira, onde estou
e escrevo, para me aproximar da fugaz precipitação
luminosa, já esse gesto me afasta em
direcção ao movimento da vida.Encontro o que é presente,
e me implica até por fim voltar as costas
ao raciocínio e à própria poesia. O que antes foi,
e se perde na descida para o instante agora vivido
é, porém, o que me atrai e dispersa.
Por quanto tempo ficarei ainda no turvo charco
da memória ?
( Mas o seu objectivo era descobrir
estados de espírito imortais nos desejos mortais,
uma esperança imperecível nas nossas ambições
fúteis...)

Nuno júdice( O meu poeta favorito) " Obra poética"