12.3.06

Descrição de um lugar

Sou um reflexo no vidro.Olho-me
fixamente, e o poema capta-me nesta atitude.
Pudesse eu conhecer-me como se conhece
o poema...
Deixo um retrato de mim,morto,
há um ano por esta altura.Que me aconteceu,
entretanto?De quem é este corpo
que me é estranho pálido habitante de um movimento
indeciso e aparente?Quem sinto quando me toco,
quem me dorme,quem me pensa,
quem me escreve? O meu rosto enconbre um pronome.vivo
uma sintaxe corrupta no patamar marítimo
do mito.Quem me impede o sentimento?Quem me abre
um caminho que não sigo,condeno o outro
de mim próprio?
No entanto,estou aqui.Entre mim e o poema,
opaco a ambos,sem nada para dizer.

Nuno Júdice "Obra poética"

4 comments:

Anonymous said...

beijinhos gandis pa ti =)

Amaral said...

Uma reflexão pertinente, uma dúvida intemporal. Quem?...Quem?... "No entanto, estou aqui." Como uma voz no silêncio, uma voz redescoberta em cada sentimento, em cada caminho que esse sentimento abre na realidade de cada um…

Dra. Laura Alho said...

Deixo-te um beijo e desejo-te uma boa semana :) *

MM said...

Apreciei bastante este texto, do qual destacaria dois belos trechos: "Quem sinto quando me toco" e "No entanto,estou aqui.Entre mim e o poema,
opaco a ambos,sem nada para dizer.", o primeiro pela busca do ser e o segundo pela procura do saber.